O livro Mulheres que Correm com os Lobos durou meses nas minhas mãos. Foi preciso tempo para absorver os aprendizados, insights e revelações que as palavras de Clarissa Pinkola Estés me trouxeram. Não foi só por sua escrita sensível, envolvente e anímica, mas por ela investigar mitos e arquétipos de contadores de histórias ao redor do mundo que realmente dialogam com as as estruturas profundas da psique. Os contos e histórias ancestrais são abertos por ela como se os leitores e leitoras estivessem a escutando numa roda de conversas, ao redor de uma fogueira, sob um céu estrelado, entre árvores longínquas.
O livro é destinado especialmente para as mulheres, porque dialoga com os arquétipos do que Clarissa chama de “mulheres selvagens”, e por isso, a comparação com o “correr com lobos” do título do livro. As mulheres e os lobos tem muito em comum. Ela também é psicóloga e tem o público feminino como seu principal campo de atuação. Mas eu já usei algumas de suas histórias em minhas leituras de tarô com homens, e, acreditem, elas também servem para eles. Acho que isso se deve ao fato tanto de mulheres e homens possuírem pólos femininos e masculinos dentro de si quanto pelos ensinamentos do livro trazerem algo a tona esquecido na consciência da maioria das pessoas: o acesso aos instintos.
Os contos foram coletados de contadores de histórias da Europa Oriental, da América Central, dos povos nativos da América do Norte, de algumas filosofias orientais, por isso, são muito diversificados. As histórias do Barba-Azul, da Vasilisa, da Manawee, da Mulher-Esqueleto, do Patinho Feio, da La Mariposa, dos Sapatinhos Vermelhos, da Pele de Foca, da La Llorona, da Menininha dos Fósforos, do Urso da Meia-Lua, da Donzela sem Mãos, e tantas outras que ela narra, permitem que acessemos chaves, codificações, padrões e experiências que nos auxiliam a libertar a mente dos predadores, porque nos conectam com nossos mais profundos instintos. São os contos de fadas que verdadeiramente deveríamos ouvir desde pequenas, para aprender sobre as fases da vida, as iniciações, os ritos, e o que a autora tanto cita, o cilo da vida-morte-vida.
“Tudo que as mulheres foram perdendo pelos séculos afora pode ser encontrado de novo se seguirmos sua pista nas sombras. E acendemos uma vela a Guadalupe, pois esses tesouros perdidos e roubados ainda lançam sombras nos nossos sonhos noturnos, nos sonhos diurnos da nossa imaginação, em histórias muito antigas, na poesia e em qualquer momento de inspiração. As mulheres por todo o mundo – a sua mãe, a minha, você e eu, a sua irmã, a sua amiga, as nossas filhas, todas as tribos de mulheres ainda desconhecidas – todas nós sonhamos com o que está perdido, com o que em seguida irá surgir no inconsciente. Todas sonhamos os mesmos sonhos no mundo inteiro. Nunca ficamos sem o mapa. Nunca ficamos sem poder contar com a outra. Nós nos unimos através dos sonhos”.
Ao longo das páginas, o que senti é que eu me redescobri, pois, ao perceber que as informações simbólicas dos contos iam ao encontro das minhas experiências, sentimentos e atitudes, compreendi tudo o que passei até então de outra perspectiva. Era como se eu olhasse para o meu passado com um olhar mais generoso, reflexivo, libertador e sem sombra de dúvidas, mais confiante. Finalmente eu entendia o que significava ser “boazinha demais” ou “braba demais”, o que era o “complexo demoníaco” que me levava aos pensamentos de fracasso, que tipos de iniciações eu ignorei amputando minha intuição, que agressões recebi pela cultura da qual faço parte.
A natureza instintiva é como um dispositivo adormecido dentro da gente e o que este livro faz é ajudar a despertar ele, quase como se entrássemos numa academia da alma feita de sábias palavras.
Espero que o mesmo aconteça com vocês, porque a consciência é libertadora. É a resposta e também a chave das perguntas.
Beijos estelares,
Júlia
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